“Há nos Açores crianças cujos direitos não são assegurados”

Francisco Maduro-Dias é o delegado regional dos Açores do Comité Português para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).
Portugal não é um dos focos da atenção da UNICEF, mas como admite Maduro-Dias em entrevista ao AO online, há ainda situações nos Açores onde os direitos das crianças são claramente infringidos e, além disso, fruto das modernas sociedades, emergem agora novas situações de “violência silenciosa” sobre as crianças. 

Qual é o papel da Delegação Regional do Comité Português para a UNICEF nos Açores?
No essencial, a missão das Delegações é a de reforçar a acção do Comité Nacional, na área geográfica onde se inserem, dando o seu contributo para a divulgação e defesa dos direitos de todas as crianças do Mundo, conforme está consagrado na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças; para a promoção do bem-estar das crianças segundo os objectivos, políticas e programas aprovados pelos órgãos superiores da UNICEF, a nível internacional e em estreita cooperação com o Comité Nacional e para a mobilização de recursos para os programas da UNICEF nos países em desenvolvimento.

Há nos Açores situações que caiam no âmbito de actuação da UNICEF?
Há certamente nos Açores crianças cujos direitos fundamentais não são devidamente assegurados, especialmente as que vivem em situação de pobreza, as que são vítimas de violência física ou psicológica, as crianças vítimas de abusos, exploradas, esquecidas e “transparentes”, apesar de um círculo familiar aparentemente rico. Tudo isso são situações inaceitáveis para a UNICEF, em Portugal ou em qualquer parte do Mundo. A sensibilidade da comunicação social para a situação das crianças, mães e pais é também fundamental para uma consciência comunitária mais profunda. Embora a UNICEF não tenha programas de terreno nos países industrializados, nos quais Portugal se inclui,  os Comités Nacionais devem, na medida do possível, alertar as autoridades responsáveis para essas situações e pressionar para que lhes seja dada resposta, pois, tal como afirma a Convenção sobre os Direitos da Criança no seu Artigo 2º, “os Estados Partes comprometem-se a garantir os direitos previstos na presente Convenção a todas as crianças que se encontrem sob a sua jurisdição, sem discriminação alguma…” A razão pela qual os programas de cooperação da UNICEF são levados a cabo apenas nos países em desenvolvimento prende-se com o mandato que lhe foi conferido pela Assembleia Geral das Nações Unidas e explica-se pelo facto de esses países não disporem dos mesmos meios que os países industrializados. Indicadores como a taxa de mortalidade infantil até 1 ano de idade, as taxas de mortalidade de menores de 5 anos, a mortalidade materna ou o PIB per capita são determinantes para o apoio da UNICEF num determinado país.

Em que medida Portugal e os Açores, em particular, contribuem para a UNICEF?
A contribuição de Portugal para a UNICEF é, sobretudo, material e proveniente do sector privado, de empresas e cidadãos que respondem aos apelos do Comité Português, que compram cartões e presentes de Natal ou que participam em acções que são levadas a cabo ao longo do ano.  Em 2007, a contribuição do Comité Português, resultante de todas estas acções, totalizou 5,4 milhões de euros. O governo português tem uma contribuição fixa muito baixa, se a compararmos com a de outros países e que em 2008 terá subido para os 300 mil dólares. A contribuição da Delegação dos Açores, que é depois incluída na contribuição nacional foi, em 2007, de 17838 euros de valor bruto. Mas há outros valores, não desagregados, que são directamente recebidos no Comité Nacional, em resposta a campanhas nacionais.

Como é que podemos situar a realidade social dos Açores no ‘ranking’ de preocupações da UNICEF?
Se as sociedades dos países em desenvolvimento necessitam de muita ajuda para estabilizar e crescer, muitas das comunidades dos países desenvolvidos vivem, no dia-a-dia, um regime de violências doutros tipos, que afecta as crianças e os pais. O afastamento do contexto familiar, horas a mais nas creches, jardins-de-infância e escolas, transportes, reduzidas horas de afecto. O resultado é uma violência silenciosa de efeitos devastadores em muitas crianças e na estrutura social presente e futura. Parafraseando J.F. Kennedy, acho melhor replicar aqui dizendo: “não perguntem o que as crianças do Mundo podem fazer por vós, perguntai antes o que podeis fazer pelas crianças do Mundo”. A origem e fim do nosso trabalho não é a UNICEF, mas as crianças. A presença da UNICEF nos Açores deve contribuir para abrirmos os nossos horizontes e percebermos onde estamos e o que podemos fazer no Mundo.

In AOriental / Rui Jorge Cabral
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