Resposta regional às dependências tem de ser “mais célere”

Em entrevista ao Açoriano Oriental Online, Paulo Fontes, da Associação Novo Dia, cuja actividade abrange os sem-abrigo, as mulheres vítimas de violência ou os repatriados, afirma que faltam respostas para o problema das dependências.

 

Como é que vai a actividade da Associação Novo Dia?

Não temos mãos a medir. Trabalhamos com homens e mulheres sem abrigo; homens e mulheres sem suporte familiar; mulheres vítimas de violência, ex- reclusos e repatriados.

Qual é a média de utentes que acolhem?

No ano passado demos apoio a 50 mulheres e 277 homens. Destes, cerca de 50 passaram pela condição de sem abrigo ao longo de todo o ano. A média permanente é de 20 a 30 pessoas, consoante a época do ano, pois no Verão procuram-nos menos.

Qual é o papel da equipa de rua?

Determinante, pois são eles que identificam os sem abrigo e procedem ao trabalho de aproximação. Além disso, dispomos de três centros de acolhimento, mais um centro de informação. Este ano a meta é montarmos mais um centro de acolhimento, o que significa que vamos ficar com dois centros de acolhimento para homens e dois para mulheres, num total de 55 camas.

Quem são os sem abrigo açorianos?

São pessoas que desistiram de viver, que perderam tudo, até a dignidade.

Tem aumentado o número dos sem abrigo?

A variação tem a ver com a época do ano e, sobretudo, com as condições de vida. A existência de sem abrigo é, também, uma consequência do progresso. As cidades têm um efeito pendular e atraem as pessoas pelas mais diversas razões. Embora constituam uma oportunidade, há sempre aqueles que ficam à margem de tudo. É histórico.

Isso leva-nos ao perfil dos sem abrigo…

As situações que levam aos sem abrigo são várias mas entrecruzam-se e, no essencial, o sem abrigo é uma pessoa que desistiu da vida. E é aqui que reside a dificuldade. São pessoas que desistiram de um trabalho, da família, da higiene; ou seja perderam a auto-estima

Como é que se consegue recuperar uma pessoa assim?

Com muito trabalho e muita dedicação. Sobretudo com muita determinação.

Estas pessoas tiveram alguma vez um projecto de vida?

Julgo que a maioria não… Vivia ao sabor do dia.

Em momentos de crise há mais sem abrigo?

Penso que os nossos sem abrigo ainda não se encaixam nesse perfil. Têm um grau de escolaridade muito baixo; viveram sempre no limiar da pobreza e não têm ou tiveram uma profissão definida. Até mesmo os repatriados.

E os imigrantes do Leste?

Talvez esses possam encaixar-se mais nesse perfil pois muitos têm formação superior, ganham uma miséria e ficam numa situação muito precária que, caso não tivessem o apoio da Segurança Social, estariam na condição de sem abrigo.

Qual é a resposta imediata que estão a dar?

A primeira coisa é a alimentação e a higiene. Há uma segunda fase que exige mais tempo. Temos que conhecer a pessoa, percebê-la e depois definir estratégias para que ela possa ser recuperada.

De que meios financeiros dispõem?

Somos financiados a 100% pelo Instituto de Acção Social e através destes apoios, apoiamos quem nos procura. O Novo Dia tem pelo menos 15 homens e 5 mulheres ocupados.

Durante quanto tempo é concedido esse apoio?

À partida durante seis meses mas a verdade é diferente. Gerimos o centro do repatriado desde 2006 e muitos dos que nele habitam já lá estão desde essa altura. Isso também mostra a dificuldade que há em lidar com estes casos.

As respostas são adequadas?

Adequadas são, o que não são é suficientes. Faltam estruturas de apoio, sobretudo,ao nível das dependências, e faltam medidas concretas de apoio aos idosos porque é bom de ver que um idoso que recebe a pensão mínima de sobrevivência vive abaixo do limiar da pobreza. Se calhar vive com menos condições que muitos dos nossos utentes.

O que é que tem faltado?

Vontade política para definir uma política clara nesta área, sobretudo nas dependências. Nós próprios queremos constituir uma equipa de rua nessa área porque já fazemos troca de seringas e precisamos de dar o passo seguinte. É precisa uma boa distribuição de Metadona nos Centros de saúde e é preciso pôr em prática (o que os médicos têm medo) os programas alternativos de substituição de drogas como o Subutex o Suboxone. O programa não foi bem introduzido na Região; os médicos não estão a fazer o trabalho bem feito e há questões de tráfico associadas e está-se a perder uma oportunidade muito eficaz de atacar um problema crescente nos Açores com consequências imprevisíveis.

 

in AOriental / Carmo Rodeia

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